Leigos Missionários Combonianos

100 dias

100 dias100 dias do maior crime ambiental na história do Brasil.

17 pessoas mortas, uma comunidade inteira destruida, lama tóxica que destrói o Rio Doce, caminhando por 600 km até chegar no oceano Antlâtico e contaminá-lo.

100 dias sem nenhum plano concreto de recuperação do rio Doce.

100 dias de impunidade absoluta.

100 dias sem ninguém na cadeia.

 

O dia 5 de novembro de 2015 era um dia tranquilo na comunidade de Bento Rodrigues, pequena cidade no interior do Minas Gerais com 600 habitantes. Naquele dia, às 16.30h da tarde, os celulares dos habitantes iniciaram a tocar como gritos que chegavam de longe. Gritos que avisavam da ruptura da barragem que continham lama de rejeito da empresa mineradora Samarco (Vale).

Um rio de lama a uma velocidade horrível, dirigiu-se aquela comunidade e, dalì a pouco, atingiu outras até entrar no Rio Doce para depois chegar no Oceano e contaminá-lo.

Uma lama tóxica com seus 15 metros de altura, com violência e destruição.

Violência que destruiu para sempre o rio, a vegetação, a fauna, a comunidade, deixando lama vermelha que não permite mais gerar vida.

100 dias se passaram e ainda tudo ficou impune, a notícia ficou de lado como se nada tivesse acontecido, como uma coisa que não interessa mais, para voltar numa aparente e falsa normalidade.

Mas a normalidade é aquela da injustiça, a normalidade é aquela que reina nos lucros desta multinacional, Vale e company, que ainda não arcou com responsabilidade por aquilo que cometeu.

Frente a esta grave situação, o governo estadual não tratou o fato como emergência, deixando à empresa a tarefa de resolver a questão com seus meios, advogado, seu comando operativo de engenheiros e pesquisadores…o seu lucro e interesse.
Em 2013 uma comissão declarou a irregularidade da barragem por causa de um aumento de erosão da montanha que colocava em risco a segurança da mesma. Um anúncio da periculosidade causada de uma exploração do território. Na hora do desastre descobriu-se que a empresa não tinha nenhum plano de emergência e que não foram tomadas medidas de segurança.
Em Minas Gerais, existem 754 barragens que contém lama de rejeito das empresas de mineração e destas, 42 não tem nenhuma certificação de segurança. Corrupção, falsos balancetes, interesses …etc…etc…

Estamos falando de empresas multinacionais que ganham bilhões.

Em Minas, empresas de mineração e políticos foram sempre parceiros como dois velhos amigos, juntos em um sistema que cria vantagens, ganhos, mas não para o bem comum, não para o povo, não para a nossa terra sagrada.
Este desastre ambiental envolve todos , porque os danos são mundiais não somente locais, e será sempre uma grande ferida aberta na história deste país.

Danos permanentemente irrecuperáveis, como a morte de pessoas e de um ecosistema que não será nunca mais o mesmo.

A campanha da fraternidade deste ano da igreja Católica no Brasil, tem como tema “Casa Comum: nossa responsabilidade”. «Scorra come acqua il diritto e la giustizia come un torrente perenne»
(Am 5, 24). A Casa Comum é a nossa Terra, uma casa tão destruída, maltratada e explorada. É preciso trabalhar por uma cultura ecológica que saiba defender, amar e curar o mundo e nós todos somos responsáveis por esta cura.

E no cuidar da terra, é preciso ainda contestar o sistema capitalista que explora, mata e cria desigualdade colocando em primeiro lugar o dinheiro e não o valor da vida.
minas100 dias passaram, 100 dias não foram esquecidos, e não devemos esquecer, não podemos construir o futuro com um presente coxo e doente nem devemos parar de denunciar.

Casa Comum: nossa responsabilidade!

A extração dos minerais por parte das sociedades de mineração destrói as montanhas de Minas, assim como em outros países no mundo.

Durante o trabalho de extração se usam reagentes químicos altamente perigosos que contaminam a terra, os lençóis freáticos e criam barragens de lama tóxica, que colocam em risco a população e as comunidades.

Emma Chiolini LMC (Fonte: artigo de Marcus V. Polignano, revista Manuelzão, UFMG)

Lembrando o passado…

Emma Brasil LMCJá se passaram cinco meses desde a minha chegada ao Brasil, eu cheguei no 1 de dezembro de 2013 em Nova Contagem, periferia de Belo Horizonte, Minas Gerais.

Os primeiros meses não foram fáceis, como todos os começos, a causa da nova cultura, língua, costumes, do jeito de fazer as coisas muito diferentes do meu, em um lugar que eu não conhecia. Você tem que ir em missão para re-aprender e ter paciência consigo e com os outros, dar-se tempo para entrar, encontrar, conhecer, se relacionar, ouvir, escutar, entender. Você tem que saber como criar a cultura do encontro, com o outro e a sua diversidade, seu tempo, seus pensamentos que permite identificar as coordenadas onde o EU e o TU se encontram, para criar um NÓS e começar um caminho partilhado. Não devemos simplesmente relacionarmos de forma superficial, mas você tem que ” tocar-encontrar ” e fazer-se ” tocar e encontrar ” e estar disposto a mudar. Não é fácil quando somos adultos, quando têm a sua própria formação, a sua própria maneira de pensar, às vezes é doloroso, difícil, mas é importante e enriquecedor. Re-aprender a saber aceitar, re-aprender a esperar, para saber como re-aprender a crescer e sobretudo, saber amar. Em missão você tem que estar com a cabeça, os pés e o coração, caso contrário, você vive de forma parcial e limitada a experiência. Nesses cinco meses eu aprendi a fazer isso e estou continuando a fazê-lo, todos os dias, com as dificuldades e os desafios que isso implica.

Foi percebendo que estou encontrando Deus de uma forma diferente, que estou vivendo de uma maneira diferente. A profundidade dos gestos, encontros, situações, lugares, permite que você crie um diálogo com Ele, muito mais intenso e profundo. Compartilhar a Palavra de Deus em uma pequena casa de tijolos, simples e pobre, tem uma sensação completamente diferente e uma visão totalmente diferente.

Aqui em Nova Contagem comecei a participar da Pastoral Carcerária, com visitas à prisão. A penitenciária é um ambiente, duro, difícil, com muitos desafios. Os primeiros são aqueles burocráticos e a demora para entrar com a identificação e revista. Na maioria das vezes consigo me relacionar com os prisioneiros em pé atrás de uma grade de ferro, num espaço pequeno, onde você tem que esticar o braço para dar um aperto de mão, superando o obstáculo das barras. São momentos importantes de encontro, momentos de escuta, de cumprimentar, de promover os direitos humanos (a pastoral carcerária tem também a finalidade de denunciar as situações indignas e injustas) e a partilha da Palavra de Deus. É um momento ‘forte’ para rezar o Pai Nosso de mãos dadas com todas as dificuldades das barras e, em seguida, concluir com uma salva de palmas para agradecer a todos.

Além da pastoral carcerária, eu estou começando a aprender o sistema APAC (Associação de Proteção e Assistência aos condenados). É uma alternativa para o sistema carcerário, onde há respeito pela pessoa e sua dignidade. Não há polícia nestas estruturas, não há revistas humilhantes, a coisa toda é mantida por voluntários e pelos próprios presos. Um sistema inovador que não pune, mas educa e são educados juntos. Viver as duas experiências: prisão e APAC, me permite ver as diferenças, ver como a APAC recupera as pessoas e o sistema prisional não, como por um lado existe o respeito pelo indivíduo e a importância da pessoa, na penitenciária, pelo contrário o encarcerado é considerado como lixo da sociedade, sem valor.

São dois mundos completamente diferentes.

Na Comunidade de Ipê Amarelo, onde eu vivo, ajudo na Pastoral da Criança. Por agora estou lidando com as famílias que visito e convido para a pesagem mensal, como uma forma de controlo para combater e prevenir situações de subnutrição, desnutrição e obesidade. Quando você entra em algumas das casas, se abre para você uma realidade feita de tanta pobreza e dificuldades.

Por fim, outro momento importante na minha experiência missionária é o grupo de familiares e de dependentes químicos (drogas e álcool). As pessoas que participam são pessoas simples, muitas vezes mulheres, mães ou esposas que compartilham histórias de dificuldades e de dor (quem perdeu um filho porque ele matou, quem tem um filho que está usando drogas, um marido com problemas de álcool). O instrumento deste grupo é simplesmente a partilha e a escuta, nos dizer como fazer para uma mudança. E encaminhar as pessoas que pedirem para uma recuperação, oferecendo ajuda, apoio, pistas. Há muita força e muita fé nestas pessoas, é um grupo que “me converte” todas as vezes. Toda terça-feira eu tenho o prazer de participar e voltar para casa transformada.

Significativa para mim é a vida em comunidade, planejando um caminho comum com os outros, acolhendo as diferenças, a reflexão e vivência da espiritualidade de Comboni, o amor a Deus e pela Vida. Tudo é um caminho de crescimento e descoberta, de mim mesmo e dos outros.

Muito importantes são os momentos de oração juntos, onde através da Palavra de Deus a gente compartilha a própria vivencia missionaria e de grupo, um momento de desabafo pessoal e comunitário.

Aqui, por enquanto, a minha caminhada missionária parte dessas reuniões, esses momentos, esses caminhos. Eu ainda tenho tanta coisa para descobrir, mas sinto-me na estrada e, com coragem e fé, em continuar esta caminhada, lembrando-me que uma missão não é fazer grandes coisas, mas pequenas coisas que têm grande valor.

Hoje 10/2/2016…

Parece ontem a minha chegada no Brasil, mas já passaram dois anos e já estou no terceiro.

Sinto um pouco de ternura lendo aqueles palavras do primeiro tempo. Lembro, ainda, os primeiros passos inseguros e com timidez. Hoje olhando atras vejo a caminhada que eu fiz e que ainda estou fazendo, uma caminhada linda, às vezes difícil, às vezes com caídas, mas sempre em pé e em subida. A missão te muda se você se deixa mudar. Não é verdade que não temos expectativas quando saímos do nosso país, temos e estas caem quando iniciamos a despir-nos da nossa mentalidade e tentamos entrar na mentalidade dos outros, deixando cair nossas barreiras.

A vida comunitária ensina muito sobre isso. Conviver junto é um contínuo mediar e mediar-se, descobrir e descobrir-se, às vezes brigando, às vezes passando momentos difíceis, mas sempre na tentativa de se encontrar. Cada um tem seu jeito, seu temperamento e também suas feridas que leva com si mesmo e as brigas não são tanto com os outros mas com estas feridas.

Precisa ser testemunha, precisa ser palavra que se encarna em ação iniciando exatamente no lugar onde se vive e este lugar é, em primeiro lugar a Comunidade.

“Comunidade, lugar de perdão e da festa”, lugar de partilha e de comunhão.

Hoje os meus passos são fortes e seguros, mas sempre em um andar de descoberta e de aprendizagem… os pés descalços.

Emma Chiolini, Leiga Missionária Comboniana

“Estive preso e foste me visitar”

pastoral penitenciaria LMC Brasil
Equipe da Pastoral Carceraria com pe. Adriano

Entre as várias atividades pastorais da Paróquia São Domingos, dirigida pelos missionários Combonianos em Nova Contagem, há também a pastoral carceraria, realizada por 15 voluntários, incluindo os Leigos Missionários Combonianos, que são parte da paróquia.

Toda terça e quarta-feira de manhã, o grupo se reúne para visitar os pavilhões do presídio de segurança máxima Nelson Hungria, localizado em Nova Contagem, com cerca de 2.000 detentos. A concentração é às 08:00 na praça adiacente ao presídio.

A realidade prisional do Brasil, assim como em outras partes do mundo, sofre de uma alta superlotação devido a um sistema prisional com pouca atenção à recuperação dos detentos.

As prisões de Minas Gerais, por exemplo, podem receber 32.000 presos, divididos em 144 unidades prisionais, na verdade, são 54.000 as pessoas reclusas nas várias unidades. Esta situação só consegue agravar as condições de vida dos presos, visando mais o punir do que o reeducar e o ressocializar, com graves violações dos direitos humanos.

A ação, e o compromisso do grupo da pastoral carceraria, formado principalmente por mulheres, é acreditar em um trabalho para promover a dignidade humana, o respeito pelos direitos humanos, e a superação dos limites do sistema prisional atual, em favor de um modelo que permita a recuperação efetiva e a reintegração da pessoa do recluso.

O mais importante da nossa atuação pastoral é o testemunho de um Deus que não discrimina a ninguém, em um lugar marcado pelo desprezo, o preconceito e a violência, fazendo nossas as palavras do Evangelho: “estive preso e foste me visitar”. É a pedagogia de Jesus, método, modelo, passo que direciona o caminho desta pastoral, reconhecendo o rosto de Deus em cada pessoa, mesmo nos presos.

Muitos são os desafios e as dificuldades enfrentadas na nossa atuação pastoral, como o excesso de burocracia que muitas vezes atrasa e dificulta o nosso trabalho, com controles, restrições às visitas, permissoes limitadas; mas é com coragem que este pequeno grupo de voluntários enfrenta as dificultades, isso possibilitou, também, em 2014, a criação de dois grupos de catequese dentro do presídio que deu a possibilidade, para alguns detentos que o haviam solicitado, de receber os sacramentos.

Para isso são fundamentais os momentos de formação permanente que realizamos todo final de mês, com um espaço dedicado à programação e à formação, que permite que os agentes de pastoral carcerária possam conhecer e aprender as ações e informações que vão ajudar a melhorar as visitas ao presídio e a relacão com os presos. Nisto ajudam, também, as formações realizadas pela diocese.

Nisso em síntese o trabalho da Pastoral carcerária. Atuação singela apertando mãos, encontrando rostos concretos, escutando as histórias de vida, dos que estão do outro lado das grades com vista a testemunhar a justiça e a dignidade de cada ser humano, porque como nos diz o Evangelho é: “Nisso que reconhecerão que sois meus discípulos: no amor que tiverdes uns para os outros” (Jo 13, 35).

Emma Chiolini, Leiga missionaria Comboniana

Ministério das Cidades seleciona projeto de reassentamento do bairro Piquiá de Baixo

Piquia

No último dia do ano, 31 de dezembro, o Ministério das Cidades publicou no Diário Oficial a Portaria no. 684, com o resultado do processo de seleção de novos projetos para o Programa Minha Casa, Minha Vida, a serem contratados no início de 2016.
Ao todo, foram selecionados projetos para mais de 7.000 habitações. No Maranhão, o único projeto selecionado foi o Reassentamento da Comunidade de Piquiá de Baixo (Açailândia).

Aprovado pela Caixa Econômica Federal (CEF) desde 17 de dezembro de 2014, o projeto esperou mais de um ano para essa seleção acontecer.
O aporte financeiro do Fundo de Desenvolvimento Social vai garantir a construção de 312 casas e a infraestrutura básica, assim como previsto pelo projeto que a Associação Comunitária dos Moradores de Pequiá (ACMP) preparou, com assessoria técnica da Usina – Centro de Trabalhos para o Ambiente Habitado.

A notícia chega logo após outra grande conquista da comunidade: o título de propriedade definitiva do terreno onde será realizado o reassentamento. Após um longo processo judicial de desapropriação por interesse social, no dia 29 de dezembro, a Associação de Moradores recebeu do cartório de Açailândia a escritura com o título de propriedade do “Sítio São João”, terreno de 38 hectares onde irá construir um bairro finalmente livre da poluição.

“Ainda lembro as primeiras manifestações que a gente fez à porta do Fórum de Açailândia, em 2008, batendo nas panelas para conseguir justiça” – lembra dona Luzinete, moradora. “Hoje conseguimos mais um passo decisivo rumo à vitória. Sinto uma grande responsabilidade por isso. Teremos que administrar bem o dinheiro e manter a unidade da comunidade”, conclui.

Os passos rumo ao reassentamento são ainda muitos: primeiro deve se dar a assinatura do contrato entre a CEF e a ACMP; em seguida, deve ser elaborada e aprovada pela CEF uma versão mais detalhada do projeto urbanístico-habitacional, o “projeto executivo”. Em seguida, virá a etapa de construção das casas, na modalidade de autogestão, tendo a Associação e sua assessoria o papel de coordenar as diversas etapas da obra. Todo esse processo deve demorar pouco menos de três anos.

“Mas agora temos a terra e o dinheiro para construir as casas! Não tem mais como voltar atrás” – comenta Ivan Gonçalves, tesoureiro da Associação de Moradores. “No sábado, 9 de Janeiro, a comunidade está organizando uma grande festa de celebração dessa vitória. Logo depois, voltaremos a arregaçar as mangas: Piquiá, reassentamento já!”.

P Dário MCCJ, Xoan Carlos LMC

 

Madeireiros e milícias na Amazônia maranhense

Nota pública de membros de 14 países da Rede Eclesial Panamazônica sobre a violência ambiental no Município de Buriticupu-MA e região

Durante todo o ano de 2015, uma onda de violência e destruição fora de controle parece se irradiar do município de Buriticupu-MA. O centro nevrálgico da atividade madeireira no Maranhão, que já devastou praticamente a totalidade do território do município, continua operante e em expansão para os municípios vizinhos. Como as áreas dedicadas à agropecuária já não possuem mais madeiras de alto valor econômico, o foco de suas atenções agora são as unidades de conservação e as terras indígenas.

Buriticupu

Para tanto, a situação geográfica de Buriticupu é privilegiada. As mais de 20 serrarias ali instaladas procuram madeira na Reserva Biológica do Gurupi e nas Terras Indígenas Arariboia, Caru e Awá, todas num raio de menos de 150 Km.

A atuação do Estado brasileiro frente a esta situação tem sido sempre fragmentada e incoerente. No nível federal, IBAMA e ICMBio têm conduzido operações pontuais de combate à retirada ilegal de madeira. As mais estrondosas com forte aparato de segurança, inclusive com a presença maciça do exército brasileiro, fizeram apreensão de equipamentos para derrubada das árvores e transporte das toras.

Porém, nada é feito para atingir o motor econômico dessa organização criminosa: as serrarias, que continuam em pleno funcionamento e despachando todos os dias dezenas de carretas carregadas de madeira extraída ilegalmente. Essas ações de repressão pontual não resolvem o problema e servem para potencializar a raiva dos madeireiros, colocando em perigo quem defende a Reserva, sejam eles camponeses, ambientalistas ou funcionários públicos.

Por outra parte o INCRA nada faz para que se cumpra a lei. Nem proporciona terras adequadas em outros lugares para que os pequenos camponeses não precisem viver na Reserva, nem desvenda a falsidade dos títulos de terras que os grandes proprietários ostentam, compram e vendem como se fossem válidos.

O Estado do Maranhão, sempre escudado no argumento de que as áreas em conflito são de competência federal, também mantém uma atitude dupla. Se por um lado a Secretaria de Direitos Humanos mostra preocupação com a situação de violência e diz estar em busca de alternativas econômicas para a extração ilegal de madeira, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) licenciou, somente em 2015, sete serrarias no município de Buriticupu, mesmo sem que existam áreas com plano de manejo florestal suficientes para justificar nem uma ínfima parte da madeira comercializada.

A situação de violência chegou ao extremo no território da Reserva Biológica do Gurupi (ReBio), com o assassinato em 25/08 de Raimundo dos Santos, presidente da Associação dos Pequenos Produtores Rurais da comunidade Brejinho Rio das Onças II. Raimundo foi covardemente assassinado com diversos tiros e golpes de facão. Tempo antes, tinha registrado boletim de ocorrência perante a polícia civil por ameaças. Sua esposa Maria da Conceição também foi alvejada com diversos tiros, presenciou a morte de seu companheiro, mas conseguiu escapar, gravemente ferida. Ela permaneceu internada por quase duas semanas no Hospital Municipal de Açailândia, sob escolta policial.

Na Terra Indígena Arariboia a estratégia dos madeireiros foi tocar fogo na mata para impedir que os Guajajara se organizassem em brigadas para combater o desmatamento. Um grupo isolado de cerca 80 indígenas Awá Guajá ficou totalmente cercado pelas chamas. Quando as equipes do IBAMA chegaram para auxiliar no controle do fogo, madeireiros armados os receberam à bala. Outras áreas indígenas da região continuam visadas e invadidas pelos madeireiros: a Alto Turiaçu (maior área indígena do Maranhão), a Bacurizinho e a Guajajara-Canabrava.

Os episódios cada vez mais frequentes de confrontos armados com equipes de fiscalização, a vigilância e monitoramento a que são submetidas as equipes dos órgãos ambientais, os constantes vazamentos da data e planejamento das operações de combate ao desmatamento e os recentes assassinatos de lideranças camponesas e ambientalistas, permitem-nos afirmar que os madeireiros (principalmente os sediados em Buriticupu-MA) formam uma extensa organização criminosa, com ramificações em vários municípios e agentes infiltrados em vários órgãos públicos (como já demonstrado em algumas operações policiais), que sustenta milícias fortemente armadas e dispostas a atirarem em quem ousar enfrentar o império da lei da força, que é a que atualmente rege esta porção do Brasil.

O Estado brasileiro perdeu totalmente o controle deste território, ao ponto de não conseguir mais nem adentrar determinadas áreas sob controle destes grupos armados. Enquanto isso, os criminosos, com o apoio de alguns parlamentares de todos os níveis de governo e de muitos prefeitos dos municípios afetados, continuam se tornando cada vez mais fortes e donos da situação.

O constante trânsito de caminhões carregados com toras de árvores centenárias, arrancadas dos últimos remanescentes da floresta amazônica do Maranhão, continuam sendo a paisagem urbana mais frequente em Buriticupu.

As entidades abaixo-assinadas, unindo-se ao clamor das comunidades atingidas[1], levanta um apelo urgente a todas as instituições que podem e devem intervir para interromper essa tragédia e evitar a morte da floresta do Maranhão e das comunidades que vivem nela e com ela.

É urgente um plano articulado, permanente e eficaz de interdição das serrarias ilegais da região e do transporte de madeira, bem como um investimento consistente em alternativas produtivas, de manejo e proteção florestal. O Estado, os movimentos sociais, as igrejas e a sociedade civil organizada como um todo precisam aliar-se nesse mutirão em defesa do futuro.

Irmã Dorothy Stang dizia: “A morte da floresta é a morte de todos nós”. A irmã morreu por essa causa, para que a vida nunca mais viesse a ser ceifada na Amazônia.

 

Assinam de Brasil, Colombia, Perú, Guayana, Bolívia, Equador, Chile, Argentina, México, Espanha, Inglaterra, EUA, Canadá, Cidade do Vaticano, em 20 de novembro de 2015:

Dom Leonardo Ulrich Steiner; Secretário Geral da CNBB, Brasília

Dom Belisário da Silva; Presidente Regional Nordeste 5 CNBB, Maranhão

Dom Mário Antônio da Silva; Presidente Regional Norte 1 CNBB, Manaus

Dom Bernardo Johannes; Presidente Regional Norte 2 CNBB, Pará

Dom Philip Dickmans; Presidente Regional Norte 3 CNBB, Tocantins

Dom Neri  José Tondello; Presidente Regional Oeste 2 CNBB, Mato Grosso

Dom Roque Paloschi; Bispo de Porto Velho – RO e Presidente do CIMI

Dom Wilmar Santin. Bispo de Itaituba – PA

Ir. Maria Inês Vieira Ribeiro; Presidente de Conferencia de Religiosos de Brasil

Ir. Irene Lopes; Secretaria Executiva da Comissão Amazônia da CNBB

Ir. Ildes Lobo; Irmãs de Santa Doroteia – Manaus

Ir. Joao Gutemberg; Maristas en la Amazonía – Manaus

Armindo Goes Melo. Yanomami. Director de Hutukara – RR

Raimunda Paixao; Equipe Itinerante missionária – Manaus

Ir. Arizete Miranda; AM

Izalene Tiene; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – AM

Chico Loebens; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – AM

Hno. Darwin Orozco; Capuchinos en la Amazonía – AM

Ir. Julio Caldeira; Consolatos en la Amazonía

Dário Bossi; Missionários Combonianos – Maranhão

Vanthuy Neto; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – AM

Mons. Pedro Barreto; Arzobispo de Huancayo – Perú

Mons. Oscar Urbina; Arzobispo de Villavicencio, Vicepresidente de la Conferencia Episcopal – Colombia

Mons. Walter Heras; Presidente Pastoral Social Caritas – Ecuador

Mons. Rafael Cob; Obispo delegado por la Amazonía de Ecuador

Rafael González Ponce; Presidente/a de Conferencia de Religiosos de Ecuador

Mons. Eugenio Coter; Obispo delegado por la Amazonía de Bolivia

Mons. Julio Parrilla; Obispo vice-presidente de Cáritas de Ecuador

Mons. Omar de Jesús Mejía Giraldo ; Obispo delegado por la Amazonía de Colombia

Mons. José de Jesús Quintero Diaz; Obispo delegado por la Amazonía de Colombia

Mons. Figueroa; Obispo delegado por la Amazonía de Colombia

Mons. David Martínez. Obispo de Puerto Maldonado – Perú

Gloria Luz Patiño; Presidente/a de Conferencia de Religiosos de Perú

Paul Martin, sj; Delegado por Obispo de Guyana

Jaime Campos, OFM; Chile

Alfonso López Tejada. Líder Kukama. Perú;

Elvy Monsanto; Departamento de Justicia y Solidariedad, CELAM – Colombia

Hugo Ramírez; ALER – Perú

Asunta Montoya; SIGNIS – Equador

Mauricio López; Comité Ejecutivo REPAM. Secretario Ejecutivo – Equador

Luis Enrique Pinilla; Comité Ejecutivo REPAM. DEJUSOL – Colombia

Pedro Sánchez; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – Equador

Alfredo Ferro; Comité Ejecutivo REPAM – Colombia

Daniela Andrade; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – Equador

Adda Chuecas; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – Perú

Humberto Ortiz; Comité Ejecutivo Ampliado REPAM – Perú

Romina Gallegos; Red Amazónica Ecuador

Augusto Zampini. Asesor Teológico; Argentina

Ana Cristina García; Cáritas Española

Clare Dixon. CAFOD; Inglaterra

Thomas Hollywood. CRS; Estados Unidos de América

Anne Catherine Kennedy – DP – Canadá
Cristiane Murray; Radio Vaticana

Hermana Mercedes Casas; Presidente de la Conferencia Latino-Americana de Religiosas y religiosos (CLAR) – México

Luz Marina Valencia; Secretario Ejecutivo de la CLAR

 

[1] Veja-se, por exemplo, os desesperados apelos dos Guajajara em Brasília e a campanha de Greenpeace denunciando o incêndio da T.I. Arariboia:

http://www.greenpeace-comunicacao.org.br/email/cyberativismo/2015-10-28m.html