Leigos Missionários Combonianos

Sobre a missão entre os Gumuz

Gumuz situation
Gumuz situation

Quando, em Novembro de 2020, regressei de Portugal, nunca pensei viver os momentos que tenho experienciado nestes últimos meses.

Vivo em Guilguel Beles, na Região de Benishangul-Gumuz, Etiópia e, na missão, trabalhamos essencialmente com o povo Gumuz (nós, Leigos Missionários Combonianos, vivemos com os Missionários Combonianos, na mesma missão). Não fechamos as portas a ninguém, mas este é um dos povos mais esquecido e abandonado da Etiópia e do mundo.

Várias pessoas de outras etnias, tais como Amara, Agaw, Chinacha, também aqui vivem. O solo é fértil e isso leva a que seja uma zona apetecível. E, por isso, muitas vezes, os Gumuz perderam terrenos que lhes pertenciam.

Mas, mesmo assim, as pessoas viviam em paz, sem grandes problemas. Em 2019, já eu estava na Etiópia, uma aldeia Gumuz foi atacada, pessoas mortas, casas queimadas. A nossa missão foi pioneira em prestar auxílio aos deslocados.

Quando regresso, em Novembro de 2020, rebeldes Gumuz começaram a atacar não Gumuz. Com grande dor soube da morte de muitos inocentes. A vida humana é preciosa.

Porém, assisti também à persecução de Gumuz. Pessoas fugiram para a floresta, casas queimadas, dezenas de jovens presos sem qualquer justificação.

Recordo-me de ir com o David, LMC, meu colega de missão, até Debre Markos, na região Amara, com dois Gumuz, pois tinham receio de ser mortos. Várias vezes fomos prestar auxílio a detidos na estação policial.

Entretanto, o Governo começou a negociar com os rebeldes Gumuz e, durante quase dois meses conseguimos abrir escolas, clínica, biblioteca.

Porém, as negociações falharam e os rebeldes Gumuz mataram mais pessoas. Nem sempre é fácil concluir negociações quando as propostas exigidas são impossíveis de concretizar.

Como resposta, rebeldes Amara e Agaw, atacaram aldeias, mataram pessoas, queimaram casas. Os jovens com quem convivia, as mulheres do grupo que seguia, as crianças da escola e jardim-de-infância tiveram que fugir para a floresta: sem comida, sem roupa, sem nada. Pessoas que eu conhecia foram mortas: inocentes!

Na nossa missão muitas têm sido as pessoas que aqui vêm para pedir comida, dinheiro para comprar comida, assistência médica …

No início preparámos comida para todos os necessitados que vinham ao nosso encontro [“dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16)]; depois com a ajuda da Diocese oferecemos massa e, diariamente, todas as manhãs oferecemos uma refeição a mais de 200 crianças. Aos Domingos oferecemos uma refeição, depois da missa.

O David todos os dias se responsabiliza pela gestão das refeições e a Irmã Nives (irmã comboniana) diariamente presta cuidados médicos a dezenas de pessoas.

Eu alterno entre ajudar no trabalho com as crianças e ir a Mandura, à missão das Irmãs Combonianas (que tiveram que deixar a missão, devido a esta situação de guerrilha, vivendo por agora na nossa missão. Mas durante o dia procuram estar na missão onde estavam, Mandura, para acolherem as pessoas que aparecerem) onde ajudo com as tarefas doméstica, tais como buscar água para os animais, para a casa (pois as irmãs estão sem água em casa), entre outros e recebemos (eu e as irmãs Combonianas Vicenta e Cristiane) as pessoas que aparecem para cumprimentar ou pedir ajuda. Muitas delas arriscam vir à missão, depois de 3/4 horas a caminhar, para buscar cereais que guardaram na casa das Irmãs ou pedir ajuda.

Tem sido muito duro escutar tanto sofrimento: pessoas que estão a sofrer, subnutrição, crianças gravemente doentes, pessoas que perderam familiares, que perderam os seus cereais. Quantas vezes me é difícil adormecer a pensar nesta realidade.

Gumuz situation

A missão são rostos e tenho presente tantos rostos sofridos. Quando na Igreja rezo e olho para a cruz de Jesus vejo imensos rostos, contemplo esta realidade sofredora e percebo que Jesus está naquela cruz por nós e que continua a sofrer diariamente por nós. Mas, ao mesmo tempo, sinto estas palavras na minha mente: não tenhais medo! Eu estou convosco!

Não é fácil viver estes momentos de sofrimento, mas a vivência da fé em Jesus, que passou a vida fazendo o bem, que sofreu, foi morto mas ressuscitou ajuda-nos a ser testemunhas do Amor de Deus entre as pessoas.

Obrigado a todos e todas que têm contribuído a vários níveis, de oração, amizade, carinho e ajuda para a missão. Sem a vossa partilha não teríamos hipótese de prestar auxílio. Muito obrigado de coração!

As tribulações não faltam, mas estai certos de que a vossa oração nos sustenta. A missão é de Deus e é nEle que devemos colocar a nossa confiança.

Abraço fraterno,

Pedro Nascimento, LMC en Etiópia

Alegria da Ressurreição

Comunidade

Neste mês de abril acolhemos em nossa comunidade Ipê Amarelo o padre Serafim que veio para somar conosco na missão. E junto trouxe a alegria da primeira missa em nossa casa de missão Santa Terezinha. Desde que cheguei há um ano e seis meses não havia acontecido a Santa missa em nosso lar. Receber Cristo Eucarístico é renovar as forças e manter viva a esperança para continuar na caminhada.

Nesse momento de incertezas, de espera onde não podemos planejar bem o futuro, os próximos passos, é imensa a alegria de poder viver esse momento, me trouxe uma imensa alegria. Eu tinha um grande desejo de falar “Cordeiro de Deus” em comunidade.

A presença do espirito missionário, o desejo de viver e trabalhar conosco em comunidade, que transpareceu nas atitudes e palavras do padre… também me fazem vibrar de alegria. O Senhor é muito bem-vindo padre Serafim, que Jesus missionário nos una e nos fortaleça para nesta caminhada, que juntos possamos viver a missão do Cristo ressuscitado.

Comunidade

Forte abraço.

Regimar Costa, LMC Brasil

NB. Regimar Costa e o marido Valmir Barp estão aguardando a abertura de fronteiras para partir em missão para Moçambique.

Mensagem de Pascoa

Sepulcro vacío

Eu sou a Ressurreição e a Vida

Sepulcro vacío

As irmãs mandaram então a dizer-lhe “Senhor, aquele a quem amas está doente”. Jesus disse: “Essa doença não é para a morte, mas para a glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por meio dela”. “Eu sou a ressurreição e a vida, quem acredita em mim, mesmo que morra, viverá…” Acreditas nisto?”. “Sim, Senhor, eu acredito que tu és o Cristo, o Filho do Deus, que vem a este mundo” (Jo 11, 3.4.25-27).

O nosso mundo atravessa um período muito difícil por causa da pandemia do Covid-19, que continua a provocar tanto sofrimento, milhares de doentes e de mortes. Várias populações estão a sofrer, não só pela Covid-19, mas também pela guerra, instabilidade, deslocações, migração arriscada, problema climático, problemas económicos. Pensando na pandemia, recordamos aqui tantos nossos confrades e irmãs que viveram esta experiência de morte e ressurreição e estão agora na glória do Ressuscitado. Nesta situação de dor, de sofrimento e de morte, em que o Cristo da Sexta-feira Santa continua a ser crucificado e morto nas pessoas que sofrem as consequências desta pandemia, não é nada fácil encontrar palavras de encorajamento, de alegria, de vita, enfim, de ressurreição.

Mas, mesmo porque somos cristãos, discípulos missionários do Senhor, nesta Páscoa somos convidados a colocar de novo a nossa confiança e a nossa esperança, nEle, o Senhor da vida, que viveu o sofrimento, a dor e a humilhação até morrer sobre a cruz, para ser ressuscitado pelo Pai. Por isso, as suas palavras a Marta perante a doença do irmão Lázaro, são mais do que nunca oportunas para nós e para a humanidade inteira neste momento: “Eu sou a ressurreição e a vida, quem acredita em mim, mesmo se morre, viverá, quem vive e cré em mim não morrerá jamais”.

A fé na ressurreição e a esperança que Ele nos trouxe são o dom maior e mais belo que nós possamos anunciar e oferecer a toda a pessoa. Por isso, nunca nos cansemos de repetir, a todos e cada um: Cristo ressuscitou! Animados por esta certeza, levamos este anúncio a todas as comunidades, a cada casa, a cada família, a todo o lugar onde as pessoas mais sofrem. Como afirma o Papa Francisco: Procuremos, na medida do possível, utilizar da melhor maneira este tempo: sejamos generosos; ajudemos quem precisa na nossa vizinhança; procuremos, talvez por telefone ou pelos social, as pessoas mais sós; rezemos ao Senhor por quantos no mundo se encontram na provação. Mesmo se estamos isolados, o nosso pensamento e o nosso espírito podem chegar bem longe com a criatividade do amor. É disto que hoje precisamos: a criatividade do amor” (Vídeo mensagem do Papa Francisco para a Semana Santa 2020).

É a missão da compaixão que, como missionários, somos chamados a anunciar, a proximidade de Deus ao seu povo, a Sua ternura e o Seu amor. Como Jesus, que curou tantas pessoas doentes, nós somos hoje os seus instrumentos para cuidar do sofrimento, curar a indiferença, o egoísmo e o afastamento que esta doença gera. É a missão do encontro que cria espaços de acolhimento, de fraternidade, que gera vida e vida em abundância para todos. Somos assim missionários da esperança e da alegria no contexto atual para recordar profeticamente a todos que “não podemos avançar cada um por sua conta, mas só juntos” (Homilia do Papa Francisco, 27/03/2020). É uma nova maneira de ser e de estar no mundo: não um simples regresso ao passado que conhecemos, mas um pôr-se em jogo com criatividade e sabedoria.

Só confrontando-nos com a cruz, podemos encontrar a esperança e viver como ressuscitados, como nos ensina São Daniel Comboni: Será possível que o coração de um verdadeiro apóstolo possa abater-se e atemorizar-se por todos estes obstáculos e extraordinárias dificuldades? Não, isso não é possível, jamais! Só na cruz está o triunfo (ES 5646). É o triunfo do Ressuscitado. Em Jesus ressuscitado, a vida venceu a morte. É a esperança de um tempo melhor. É uma esperança que não falha.

Com estes sentimentos de alegria queremos desejar-vos uma Santa Páscoa de Ressurreição!

Roma, 19 março 2021

O Conselho Geral mccj