Leigos Missionários Combonianos

A apropriação de terras e a governança justa em África

landgrabA apropriação de terras e a governança justa discutida numa conferência pan- Africana inédita a partir de hoje, antes da visita do Papa a África.

A conferência irá destacar o estado da apropriação de terras em África, casos de resistência em todo o continente, bem como as respostas da Igreja e o seu envolvimento crescente na luta contra esta ameaça.

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Terras da comunidade Gassol, atribuídas a Dominion Farms na Nigéria. Foto por CEED

A apropriação de terras é um problema grave em toda a África, que requer atenção urgente uma vez que ameaça a subsistência e segurança alimentar. Já originou centenas de milhares de pessoas deslocadas das suas terras, privando-as do acesso aos recursos naturais e ameaçando os seus meios de subsistência.

A apropriação de terras e a governação justa, questões que constituem uma ameaça significativa para a soberania alimentar, serão discutidas na conferência “Land Grab and Just Governance in África” , que começa hoje em Nairobi , no Quénia, promovida pela SECAM (Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar ), com a colaboração de AEFJN (Rede África Europa Fé e Justiça ), AFJN (África Faith & Justice Network ) e CIDSE (Aliança de Agências Católicas de Desenvolvimento). O evento reunirá cerca de 150 participantes provenientes do continente Africano e também de fora do continente, incluindo muitas pessoas diretamente envolvidas na resistência à apropriação de terras.

A apropriação de terras é mais frequentemente descrita como a aquisição de grandes áreas de terrenos nos países em desenvolvimento por empresas internacionais, governos ou indivíduos. Nos últimos anos, a apropriação de terras aumentou na sequência da subida a nível mundial dos preços dos alimentos em 2008, levando os investidores a olhar para o Sul Global, particularmente para África, como investimento potencial de terra para produzir alimentos e biocombustíveis destinados à exportação e mercados internacionais. Grandes extensões de terra também estão a ser adquiridas com fins especulativos, conhecidos como “land banking” , onde o comprador detém a terra e vende-a mais tarde.

Entre os casos que serão apresentados durante a conferência, encontra-se o que envolve o projeto italiano Senhuile SA, que arrendou 20.000 hectares de terras na Reserva Ndiaël no Senegal, a terra usada há décadas pelas comunidades de cerca de 40 aldeias da região. Isto resultou num conflito permanente com as populações, que exigiram que o projeto parasse. O caso dos agricultores no Estado de Taraba, na Nigéria, e no Quénia, que estão a ser forçados a sair das terras que cultivaram durante gerações para dar lugar a plantações de arroz da empresa norte-americana Dominion Farms, também será um tema de discussão. Os casos que envolvem o negócio de terras da Bollore na Costa do Marfim, Camarões, Libéria, bem como casos da Serra Leoa, Moçambique, República Democrática do Congo e Mali serão também apresentados.

landgrabEsta conferência tem lugar antes da visita do Papa Francisco ao Quénia , Uganda e República Centro- Africana. O Papa já manifestou grande preocupação com a questão da usurpação de terras. No discurso proferido na FAO (Organização para a Alimentação e Agricultura da ONU) em Roma em junho de 2015, o Papa advertiu contra a “monopolização de terras de cultivo por parte das empresas e estados trans – nacionais, que não só priva os agricultores de um bem essencial, mas que afeta diretamente a soberania dos países ” . O Santo Padre destacou ainda que “Há já muitas regiões em que os alimentos produzidos vão para países estrangeiros e a população local é duplamente pobre, porque não tem nem comida nem terra”.

Na Carta Encíclica “Laudato Si”, o Papa apresenta mais orientações e indicações em relação aos perigos da apropriação de terras, denunciando uma abordagem exploradora da terra, recordando que ” para eles (as comunidades indígenas), a terra não é um bem económico, mas dom gratuito de Deus e dos antepassados que nela descansam, um espaço sagrado com o qual precisam de interagir para manter a sua identidade e os seus valores. Eles, quando permanecem nos seus territórios, são quem melhor os cuida. Em várias partes do mundo, porém, são objeto de pressões para que abandonem as suas terras e as deixem livres para projetos extrativos e agropecuários que não prestam atenção à degradação da natureza e da cultura.”(146). Reforçando a “Laudato Si” e antecipando a COP 21 (Conferência do Clima em Paris), as Conferências Episcopais de todo o mundo assinaram no dia 22 de outubro, um apelo que pede à COP 21 “para garantir o acesso das pessoas à água e à terra para garantir sistemas alimentares sustentáveis e resistentes às alterações climáticas, que dão prioridade a soluções orientadas para as pessoas e não para o lucro.

Esta conferência visa desenvolver estratégias para apoiar e fortalecer as comunidades locais nas suas lutas para deter esta ameaça e para criar resiliência.

landgrab Enviado pelo Flávio Schmidt (LMC Moçambique participante)

“Colorindo África”

Carmen LMC

Como tudo se torna maravilhoso quando se faz coisas bonitas, criando, inventando e “construindo” a partir da imaginação e dos materiais que temos à nossa volta.

No orfanato de St. Jude surgiu o “Art Studio”, um espaço preparado por uns amigos espanhóis que vieram este verão visitar-nos. Limparam, organizaram e pintaram um armazém que foi transformado num sítio encantador.

Foi um sonho que se tornou realidade, porque graças ao meu “lado artístico” queria muito poder fazer algo “diferente e bonito” com as crianças do orfanato. Por vezes com os mais velhos (14-15 anos) não é muito fácil a comunicação, porque estão naquela idade difícil e mostram-se um pouco contra tudo. Estava confiante que através destas atividades essa comunicação se tornaria mais fácil, o que realmente aconteceu.

Muitas ideias na cabeça, muito tempo recolhendo restos de bonitos tecidos africanos, caricas e sementes, plásticos, sacos e guardando tudo com paciência, com a esperança de poder vir a fazer coisas divertidas com todo este material.

É um laboratório artístico onde nos juntamos a trabalhar, fazendo bolsas, cadernos, brincos, pulseiras e outras coisas que se vão transformando conforme o trabalho vai evoluindo (porque estão sempre a surgir novas ideias). Ouvimos música e falamos mas o melhor é olhar para a nossa bonita loja, resultado de dois meses de trabalho.

A finalidade não é só a loja, mesmo que seja importante conseguir algum dinheiro que ajude a mantermo-nos a cada dia, o que não é fácil.

Queríamos que as crianças tivessem oportunidade de trabalhar com a imaginação e a criatividade, elementos que considero importantes para o desenvolvimento da pessoa. Não queríamos apenas que nos juntássemos para fazer pulseiras, mas para ver uma mesa cheia de coisas e pensar: “o que pode sair daqui?” Propor, inventar e porque não…. Sonhar um pouco.

Antes de iniciar, pedi a Deus paciência para explicar às crianças como trabalhar e, pedi-Lhe também, que conseguisse transmitir-lhes o meu entusiasmo, porque a mais animada com tudo isto era eu, e acho que continuo a ser. J

Os resultados são maravilhosos, e realmente temos surpreendido toda a gente, incluindo o Ir. Elio, o diretor, os trabalhadores e pessoas que vêm visitar o orfanato, todos ficaram encantados com o nosso pequeno cantinho artístico.

Claro que os trabalhos estão divididos segundo as idades, há quem se dedique a dar marteladas nas caricas para que fiquem planas, quem recorte as letras, quem use a cola, as tesouras, quem une as peças com o elástico… mas o que quer que seja que cada um faça o melhor é estarmo-nos a sair bem, e todos nos alegramos vendo o resultado do nosso trabalho.

Quando se dão conta que podem fazer coisas maravilhosas, sentem-se orgulhosos e querem fazer mais, e o fato de as verem “expostas” na nossa loja, fazem sentir-se verdadeiramente importantes.

Atualmente se vieres visitar o orfanato de St. Jude em Uganda, para além de jogares, passeares com os que estão de cadeira de rodas, leres e pintares, correres e fazeres todo o tipo de coisas que se pode fazer com 100 crianças juntas, tens que passar pelo nosso “Art Studio”, primeiro para veres como trabalhamos e depois, como é obvio, para comprares alguma lembrança na nossa loja.

Cá vos esperamos!

Carmen Aranda LMC

Um tempo feliz em Carapira – Moçambique

GermanoA ida de Jesus, relatada no evangelho do Domingo XXIII do tempo comum, até a um território fora da tradição judaica, diz-nos da preocupação que Deus tem com todos, não deixando ninguém de fora. Um surdo é encaminhado até Jesus, porque não ouvindo não sabe nada dele e logicamente não o poderia procurar por própria iniciativa. A quem não conhece Jesus não temos de censurar, mas antes conduzir até ele.

Na caminhada que fazíamos para a ida a Moçambique íamos ao encontro do esquecido pela sociedade, falo dos sem abrigos e dos mais pobres, pois, por muito que as pessoas sejam solidárias, esquecemos do verdadeiro sofrimento destes nossos amigos, a solidão. Quantas vezes disseram-nos que eramos diferentes, levávamos um sorriso, um abraço, uma palavra amiga…pois foi esse sentimento que quis levar comigo para Carapira. Não sabia o que ia encontrar em concreto, mas, levei o coração aberto, alegre, cheio de amor para dar. Nós temos que aprender com Jesus a sentir os problemas dos outros e a envolver-nos na sua solução. Foi esse sentimento e objectivo que tentei realizar, e o grupo Fé & Missão executou. Abrimo-nos, escutamos, olhamos, envolvemo-nos e comprometemo-nos com os alunos da Escola Industrial de Carapira, com a família missionária existente, (Padres, Irmãos, Irmãs, Leigos) assim como na comunidade de Carapira. Onde saliento o belíssimo trabalho de todos, de especial modo os dos Leigos Missionários, os quais se encontram próximos das pessoas, das comunidades e dos seus problemas diários, assim como dos alunos da Escola Industrial de Carapira.

Todos os dias ia ao encontro da comunidade de Carapira, após ter rezado as laudes (06:00), ter “matado o bicho”, expressão engraçada que quer dizer tomar o pequeno almoço, ia entre 1:30 a 2:00 ter com as crianças, brincava com elas, levava um sorriso, ajudava a tirar água do poço ás mamãs…o estar com as pessoas, dar um abraço e uma palavra amiga a todos que encontrava. Aprendi que quem nada tem de bens materiais, são de facto os mais felizes, pois não se preocupam com o aspecto físico do outro, com a maneira de vestir e de estar, mas sim a alegria de estar e poder partilhar o pouco que se tem com o outro.

Saliento alguns momentos marcantes na minha estadia, numa sexta-feira fui visitar com o Padre Firmino a comunidade de Caserna, era o dia de baptismos, adorei participar nesta festa tão bonita e de uma cultura especial, enquanto o Pe. Firmino confessava os jovens que iam ser baptizados, eu fui dar uma volta na comunidade, e numa das casas, estava um jovem de 12 anos, o David, deitado na entrada da casa, gemendo com dores. Após ter questionado o que se passava e não ter obtido resposta do jovem, aparece a mamã do David, onde informa-me que foi mordido por um bicho. O David, tinha a mão muito inchada, ao ponto de eu ter ficado transtornado, tentei alertar a mamã para ir ao médico, mas, ela disse-me que não podia, era muito longe o centro de saúde, e não tinha dinheiro para ir de Chapa, o único transporte que poderia apanhar. Não consegui ficar impune a esta situação, entretanto levava na mochila água potável, onde limpei a mão do jovem, e ofereci-lhe uma fatia de bolo, que levava para comer caso tivesse fome, o David adorou comer algo doce e tão bom.

Quando cheguei à Escola de Carapira, dirigi-me à casa dos Leigos Missionários, e fui pedir ajuda à Márcia, uma das Leigas que trabalha nesta missão, Portuguesa e do Distrito de Aveiro, onde prontificou-se logo de auxiliar o David.

Na semana seguinte encontrava-me com um grupo de cinco jovens de Carapira, na rua a conversar, quando de repente vejo um homem a carregar nas suas costas uma mulher, a mesma estava doente com malária, e o senhor estava de rastos, não conseguia andar muito. Pedi ajuda aos jovens para auxiliar o senhor, mas a resposta foi negativa, pois era normal, a senhora estava com a malária…mas não pude ficar a ver esta situação sem fazer nada, então eu auxiliei o senhor, ele carregava a senhora nas costas, e ele apoiou-se em mim, nos meus ombros…onde não fiz muito, mas penso que ajudei, pois senti que fui útil. São pequenos gestos que podem mudar o mundo.

O que menos gostei de viver e de ver em Moçambique foi a falta de condições em relação à saúde, à educação e aos direitos de igualdade, pois a mulher é considerada inferior ao homem. Mas a alegria, a simpatia, a simplicidade daquelas pessoas faz superar todo o negativismo existente, quero salientar a “educação daquele povo”, onde são educados (gostam de cumprimentar as pessoas), mesmo não terem direito à instrução escolar que muitos povos obtêm.

Todos nós tivemos várias responsabilidades, umas mais atarefadas, outras mais folgadas, mas todas muito importantes e com sentido de missão. Vivemos, trabalhamos como uma comunidade. Agradeço a todas as pessoas que nos receberam, nos acolheram, que confiaram em nós…mas de modo especial aos jovens da Escola Industrial de Carapira, ao 3º B, dos quais senti-me mais próximo e todos os dias lembro-me deles, rezo para que estudem, lutem por um futuro melhor e que não se esqueçam que podem ser o que quiserem, não são inferiores a ninguém.

Vivi um sonho do qual nunca esquecerei. Posso dizer que “Cheirei a Missão”, a qual realizou-me como homem e como cristão. Quero voltar!!

Por isso e para isso, peço ao Senhor que nos cure da surdez e da cegueira e nos coloque em comunhão sincera com o seu amor e com o mundo que nos rodeia.

GermanoAté breve Carapira – Moçambique!

Germano Ferreira

O amor como missão

MarianaSe há um ano me dissessem que, hoje, estaria a escrever-vos sobre a Missão de Carapira, dir-vos-ia que eram uns sonhadores e que esses eram terrenos férteis e distantes demais para mim. Mas Deus, como diz o Padre Jorge, sabe melhor aquilo que faz do que nós aquilo que queremos. E é tão verdade!
Antes de me lançar nesta arriscada aventura de tentar traduzir para palavras aquilo que durante este mês de agosto vivi em Carapira, quero que saibam que muitos sentidos se vão perder: as mãos que tocam e são tocadas; os cheiros que se estranham, mas depois se entranham, como o da terra, o do mercado, do lixo a queimar, do próprio ar quente e pesado; os olhos que veem rostos que parecem pedir que os descubramos e sorrisos que nos lembram que a vida é o maior dom de Deus; as bocas que cumprimentam a cada instante, mesmo quando não conhecem.
Agradecer, em primeiro lugar, aos missionários que já se encontravam em Carapira e que, além de serem discípulos de Cristo, foram anunciadores da nossa chegada e acompanhantes fiéis dos nossos passos, ao mesmo tempo que nos deixaram ser livres. Obrigada pela fé e confiança que depositaram em nós, sem a qual nenhum trabalho podia ser desenvolvido.
A primeira dificuldade com que me deparei foi o tempo. Em Carapira, o tempo parece parado no tempo e, de facto, os dias corriam vagarosamente. As manhãs eram bem maiores do que as tardes e um encontro marcado às três, podia ser a qualquer hora depois da hora combinada. Achava eu que o tempo lá era demorado, porque estava completamente embrenhada no ritmo frenético a que o mundo ocidental nos impõe. Foi então que percebi que ser compassivo é andar no passo do outro. Se o outro vai mais devagar, caminho mais devagar com ele. Rapidamente nos deixamos levar por este tempo tão diferente do nosso e os dias encheram-se: com o estudo noturno na Escola Industrial; com o apoio às meninas do Lar das irmãs “Mãe de África”; com a apresentação da encíclica “Laudato Si” aos alunos da EIC, aos professores, à comunidade, aos padres e irmãs; preenchíamos os dias com momentos em que rezávamos o Terço nas comunidades e tentávamos aprender o macua, em que visitávamos os doentes, ou substituíamos quando algum professor faltava.
Em Carapira descobri maravilhas mil. Numa das vezes em que tentava ajudar as meninas com o Inglês, e em que o tema era “famous people”, tentei exemplificar com o Cristiano Ronaldo e foi então que percebi que caíra no tremendo erro de olhar a realidade com os meus olhos apenas. Não vos digo que não me espantei, mas depressa arranjei o exemplo certo, que sempre estivera ali e que elas conheciam tão bem: Jesus. Quem mais poderia ser tão à escala planetária quanto ele? Nós que íamos com uma vontade gigante de dar a conhecer Jesus aos outros, íamos, passo a passo, percebendo que ele já lá estava e que se revelava nas pequeninas coisas: nos abraços que recebi quando fui com a irmã Maria José levar as meninas a casa para passarem as férias; Jesus mostrou-se na forma calorosa com que este povo nos recebeu à chegada e aceitou que estes estranhos fizessem parte do seu quotidiano sem nunca nos fecharem a porta.
Vi nestas crianças o rosto de Deus, porque elas, sem nunca o saberem, foram e são um exemplo para mim. Elas conseguem ser tão iguais e diferentes na sua pequenez. E quantas infâncias existem por esse mundo fora. Estas são as crianças, os heróis de palmo e meio, que antes de saberem falar, carregam baldes de água nas mãos e na cabeça. Como se ali, naquele exato momento, tivessem de suportar um fardo que não é o delas. Estas são as crianças que carregam tijolos. As crianças que tomam conta de outras crianças como elas. São crianças que estão a quilómetros e quilómetros de casa para poderem andar na escola. Surpreendi-me, ainda, com a capacidade que tinham de correr para os nossos braços, com os sorrisos sinceros e contagiantes. E digo-vos que nunca, mas mesmo nunca, me poderei esquecer de como corriam rua acima e rua abaixo com carrinhos de mão feitos com garrafas de plástico e tampinhas, ou das corridas que faziam a empurrar os pneus com um pau.
Comovi-me quando me apercebi que há quem saia de casa, três e quatro horas antes da missa, para poder beber da palavra do Senhor. Não posso não me lembrar dos jovens, vocacionados, que percorreram quilómetros a pé e/ou de bicicleta para poderem estar num Domingo em formação. E fazem-no todos os meses. Aqui, às vezes, quando chove, ou faz frio, as crianças já não querem ir à catequese. E mesmo nós, pergunto-me, quantas razões já procurámos para desculpar as nossas faltas de missa? Perante isto, fica a desconfortável certeza de que quem quer, arranja maneira, quem não quer, arranja uma desculpa. Eles são a prova viva disso!
Há gente, sim, gente como nós, que nos espanta por serem felizes com tão pouco. Tão pouco não…elas são felizes por, simplesmente, viverem. E que dom tão grande é este: a vida! E quão grandes são, imaginem vocês, estas pessoas por serem, profundamente, agradecidas e cumprirem os desígnios do Pai. No fim deste mês, sei que o meu contributo foi apenas uma gota num oceano de tarefas que faltam cumprir-se. Contudo, como li no mercado logo no primeiro dia em que lá fui:” A força parada não reproduz nada”. Fico com a certeza que nos mexemos e que ser jovem e cristão, nos dias de hoje, é ser precisamente essa força que não para nunca. É não nos deixarmos cair na indiferença para que a vida nos toque e sejamos capazes de fazer o que Deus espera de nós. Por pouco que seja, façamo-lo, porque se há coisa que aprendi por aqui, é que do pouco se faz muito. E o meu coração está tão cheio e agradecido por esta experiência.
Um “Koshukuru” (obrigado) do tamanho da distância que separa Portugal e Moçambique é pouco para tudo aquilo quanto pude viver neste mês. Até a um futuro regresso, fica um oceano imenso de saudades e a vontade de novos reencontros. E sabem uma coisa? Eu acredito, sinceramente, naquela velha máxima do “Principezinho” que diz que “aqueles que passam por nós, não vão sós nem nos deixam sós”. Hoje, sou uma sortuda por todos os encontros que tive nesta terra que é um paraíso perdido no meio do nada. Hoje, sou mais rica por ser um bocadinho de todos aqueles com quem partilhei este mês.
Mariana Mariana Gonçalves

Testemunho em Carapira

Carapira

O essencial é invisível aos olhos”! Nunca esta frase me fez tanto sentido como depois de Moçambique… Quando nos atrevemos a abrir o nosso coração aos convites de Deus, arriscamo-nos a descobrir o verdadeiro sentido da felicidade. De facto, foram tantas as graças recebidas, tanto o amor vivido e partilhado, que esta experiência me moldou a vida, me encheu o coração de tal forma que os meus pensamentos, desejos e sonhos se dirigem todos eles para Moçambique.

Durante todo o ano que antecipou este mês de missão em Moçambique, fomo-nos preparando com obras de caridade, formações intensas, encontros íntimos com Deus através da oração e, portanto, as expectativas eram elevadas e a ansiedade imensa. A verdade, porém, é que nunca pensei que este mês fosse vivido com tanta intensidade, com tanta entrega, com tanto amor… Fraca fé a minha, sei-o agora! Afinal eram imensas as pessoas que ficaram a rezar por nós, eram muitos os corações sinceros que por nós dirigiam as suas preces a Deus.

Os sete membros grupo Fé e Missão que aterraram na missão de Carapira, em Moçambique, só têm motivos para louvar a Deus pelas graças que lhes foram concedidas.

Em Carapira, acolhidos como família pelos vários membros da família comboniana aí presentes, desde o início que nos sentimos acolhidos, integrados. Logo na primeira noite tivemos um encontro de apresentação entre todos, o que nos permitiu conhecer um pouco do trabalho realizado, bem como para afirmar a nossa vontade em trabalharmos intensamente nesse mês. Sim, sempre foi uma preocupação de todo o grupo entregar-se por inteiro, ou, nas palavras de Fernando Pessoa, pormos tudo quanto somos no mínimo que fazemos. E não ficámos sem resposta. Logo no dia seguinte tivemos uma reunião em que nos foram dirigidas várias propostas, seja na Escola Industrial de Carapira, no trabalho pastoral, no lar das irmãs, bem como junto da comunidade. Recordo-me que após essa reunião o grupo começou a dividir tarefas, a especificar as tarefas de cada um, com uma intensidade tal que preenchemos um quadro, no qual anotávamos sempre todas as nossas actividades. Sentia-me sempre alegre por ver aquele quadro cheio. Tenho plena consciência de que isso só foi possível pela confiança que depositaram em nós desde o início, mas também sei que ao longo do mês tudo fizemos para corresponder às expectativas. Para ser sincero, apesar de querer dar o máximo de mim, de querer trabalhar intensamente, sempre tive a consciência de que um mês seria muito pouco para nos podermos entregar sem reservas. A verdade é que me enganei. Claro que a dificuldade da língua e a adaptação dificultaram um pouco, mas também os sorrisos, a simpatia, a confiança depositada em nós e o acolhimento fantástico com que nos presentearam, tornou tudo muito mais fácil. Desde o início que o irmão Luís permitiu que nos entregássemos sem reservas na escola, seja com trabalhos administrativos, seja em acções com os alunos; o padre Firmino a permitir que o acompanhássemos nas visitas às comunidades; as irmãs a permitirem que as auxiliássemos com as explicações às meninas do lar, bem como a irem connosco visitar os doentes e idosos da comunidade e os Leigos Missionários Combonianos que sempre nos acompanharam de perto e com quem trabalhámos com prazer. O trabalho das irmãs e dos irmãos e padres já conhecia minimamente pelos vários testemunhos que tenho ouvido. Mas confesso que desconhecia o grande trabalho que é feito pelos Leigos Missionários Combonianos. A sua dedicação na Escola Industrial de Carapira, nas aulas, nos serviços administrativos, na enfermaria, no refeitório, bem como no acompanhamento das actividades extra curriculares é deslumbrante. Mas, para além disso, o trabalho pastoral nas comunidades, o trabalho na paróquia, na formação dos animadores, o trabalho da Comunidade Justiça e Paz em pro das comunidades, deixaram-me deslumbrado. Sinceramente, pela primeira vez, fiquei mesmo com o desejo de ser Leigo Missionário Comboniano.

A nível pessoal, este mês foi muito importante para mim. Descobri muitos dos meus limites, quando o cansaço procurava vencer-me, fui desafiado a saber viver em comunidade, a saber ser tolerante, a procurar resolver as questões pelo diálogo, a analisar-me interiormente. Agora que penso nisto tudo, alegro-me pelo que pude crescer. Mas, para além de todos estes desafios fui tão feliz… Foram as Eucaristias que tanto me encheram o coração, com músicas e danças que expressavam tanto, foram os sorrisos das crianças, a alegria das pessoas das comunidades, a família comboniana em Carapira a quem agora chamo de amigos e amigas, as meninas do lar que tanto me fizeram sorrir, os jovens da Escola, os jovens… Oh meu Deus, que saudades! Apetece-me chorar de alegria…. Apetece-me voltar… Quero voltar!!!

Em Moçambique senti o Sol na minha mão! O Sol da alegria, o Sol que ilumina a nossa vida, o Sol que nos aquece, que aquece o nosso coração, o Sol que nos permite trocar olhares, o Sol que nos faz viver intensamente o dia! Em Moçambique tive o Sol na minha mão! Carapira Pedro Nascimiento