Leigos Missionários Combonianos

Moçambique: NÃO aos açambarcadores de terras

Mozambique

Uma trintena de missionários e missionárias combonianos que trabalham nas províncias combonianas da Europa participaram no “Simpósio de Limone 2015”, um evento organizado pelo Grupo Europeu de Reflexão Teológica (GERT), de 7 a 11 de Abril de 2015, na casa natal de Comboni, em Limone sul Garda (Itália). O tema deste ano foi: “Ser boa notícia hoje na Europa: consolidar, aprofundar e imaginar”. No final do Simpósio, os participantes assinaram um comunicado para condenar o projecto do Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar do Governo de Moçambique que vai conceder 102 mil quilómetros quadrados de terras férteis (a superfície total de Portugal é de 92.090 quilómetros quadrados) ao consórcio privado ProSAVANA, constituído por empreendedores moçambicanos, japoneses e brasileiros. Publicamos de seguida o comunicado dos missionários.

 

Moçambique: NÃO aos açambarcadores de terras Mozambique

Acaba de se abrir nestes dias, em Moçambique, mais um gravíssimo capítulo de açambarcamento de terras, problema usualmente conhecido por ‘land grabbing’.

Na verdade, o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar do Governo de Maputo publicou, recentemente, um documento de 204 páginas, nas quais se refere à concessão de 102 mil quilómetros quadrados de terras aráveis (recorde-se de que a superfície total de Portugal é de 92.090 quilómetros quadrados) ao Consórcio ProSAVANA, que é constituído por empreendedores moçambicanos, japoneses e brasileiros. Estas terras fertilíssimas encontram-se na região norte do País, nomeadamente nas províncias de Nampula, Niassa e Zambézia. Neste mesmo território, habitam cerca de quatro milhões e duzentas mil pessoas; deste modo, é inacreditável como Moçambique, que conta com aproximadamente 30 milhões de hectares de terras cultiváveis, ceda cerca de 10,2 milhões de hectares a um consórcio privado.

O Governo de Maputo afirma que este projecto beneficiará os pequenos agricultores e contribuirá para a alimentação da população, enquanto se sabe muito bem que tal projecto utilizará muito pouca mão de obra local, porque serão utilizados meios mecânicos de alta tecnologia e o produto final servirá exclusivamente para a exportação.

Assim, perguntamo-nos aonde irá toda aquela população que será obrigada a abandonar as suas terras? E, depois, qual será o impacto ambiental de um tal megaprojecto? Que consequências terá sobre as águas subterrâneas? E, finalmente, quais efeitos políticos terá sobre o já frágil equilíbrio por que se rege hoje a paz em Moçambique?

Em apoio às associações de agricultores locais e aos nossos confrades e co-irmãs que com eles trabalham, nós missionários, missionárias, seculares e leigos combonianos da Itália e da Europa, reunidos em Limone sul Garda, na Itália, na casa natal de São Daniel Comboni, lançamos um grito de alarme contra este mesmo acto de ‘land grabbing’ que, mais uma vez, será pago dolorosamente pelos mais de quatro milhões de pessoas pobres que vivem naquelas regiões.

Mozambique

Limone sul Garda, 10 de Abril de 2015

Padre Alberto Pelucchi, vigário-geral dos Missionários Combonianos
Padre Alex Zanotelli, Director de Mosaico di Pace, Napoli (Itália)
Padre Antonio Guarino, Castel Volturno, Napoli (Itália)
Padre Antonio Porcellato, vigário-geral da Società Missioni Africane (SMA), Roma
Padre Arlindo Pinto, Coordenador de Justiça e Paz do Instituto comboniano, Roma
Padre Benito De Marchi, Inglaterra
Padre Dario Balula Chaves, Portugal
Padre Domenico Guarino, Palermo (Itália)
Padre Efrem Tresoldi, Director da revista Nigrizia, Verona (Itália)
Padre Fernando Zolli, Firenze (Itália)
Padre Gianluca Contini, Roma
Padre Gino Pastore, Troia (Itália)
Padre Giorgio Padovan, Brasil
Padre Giovanni Munari, Superior Provincial dos Combonianos de Itália
Padre Guillermo Aguinaga, Polónia
Padre Juan Antonio Fraile, Espanha
Padre Karl Peinhopf, Superior Provincial dos Combonianos de língua alemã
Padre Martin Devenish, Superior Provincial dos Combonianos do Reino Unido
Padre Ottavio Raimondo, Bari (Itália)
Padre Palmiro Mileto, Bari (Itália)
Padre Pierpaolo Monella, Limone sul Garda (Itália)
Irmã Dorina Tadiello, Superiora Provincial das Combonianas de Itália
Irmã Fernanda Cristinelli, Comboniana, Roma
Irmã Kathia Di Serio, Comboniana, Verona (Itália)
Prof. Carmelo Dotolo, Pontifícia Universidade Urbaniana, Roma
Clara Carvalho, Secular Comboniana, Portugal
Comunidade dos Laici Missionari Comboniani, La Zattera, Palermo (Itália)
Dra. Felicetta Parisi, Napoli (Itália)
Irmão Friedbert Tremmel, Alemanha
Maria Lucia Ziliotto, Secular Comboniana, Treviso (Itália)

Adjunto:

Comunicado_de_imprensa_ProSAVANA.pdf

Master_Plan_ProSAVANA.pdf

Voz à Missão

Recebemos, com alegria, um testemunho da missão da Missionária Secular Palmira Pinheiro que se encontra atualmente na República Centro-Africana com a LMC Élia Gomes. Aqui deixamos o testemunho das alegrias e canseiras desta missão do coração da África

VOZ À MISSÃO

Embora hoje não seja Samedi (sábado), o Samedi chegou! Como sempre fora de horas, quando eu já fechei a porta do Dispensário e com vontade de descansar um pouco, pois o cansaço já se faz sentir. Porém, mesmo que eu comece a rabujar com a mãe, porque não são horas de vir, o seu sorriso, os seus olhitos brilhantes como duas estrelas, os seus bracitos estendidos para mim, fazem-me desmoronar completamente do meu mau humor. Todos são meus queridos, mas o Samedi tem um lugar especial no meu coração. Não fosse ele um dos meus primeiros casos de sucesso! Era uma criança destinada a morrer, mas a Vida venceu!

PalmiraLogo na segunda semana que aqui cheguei, em certo dia, quando estava já para fechar a porta do Dispensário, aparece uma mulher, por sinal pigmea,que me deu  a ideia de uma débil mental e que trazia nos braços uma criancinha que segundo explicação de alguém que a acompanhava seria um prematuro, recém-nascido e que a mãe não tinha leite para o alimentar, Pesei o bebé, que realmente não chegava a 2 quilos, porém era um bebé ”de tempo”, pois os pigmeus são todos pequeninos. O que ele tinha, realmente, era fome, pois esta mãe, que parecia em depressão, embora com uns peitos enormes, não estava motivada para dar de mamar, pelo que as glândulas mamárias precisavam de ser estimuladas pela sucção do bebé para segregarem o “suco da vida”.

Deixamo-la ficar no Centro de Reabilitação durante cerca de um mês e meio em que se tentou alimentar a mãe e incentivá-la a dar de mamar ao filho, o que se tornava tarefa difícil, pois que nós não podíamos estar sempre presentes e, quando íamos, encontrávamo-la deitada na varanda do Centro a dormir com o enorme peito estendido, acriança deitada também ao lado, porém, como é lógico, sem a capacidade de pegar no peito e mamar. Valemo-nos, então de uma outra mãe, também ela pigmeia, e que estava a acompanhar o seu pequenito desnutrido, o jean Pierre, outro dos meus favoritos, a quem encarregamos de a espicaçar para que desse de mamar ao filho. E, assim se foi ultrapassando a fase mais crítica, em que, para piorar a situação iam aparecendo algumas doenças (paludismo, broncopneumonia, diarreia, etc.) às quais se ia dando resposta com a devida medicação. Até que um belo dia a mãe resolve ir embora sem dizer nada e, então perdemos a esperança e dissemos: – ele vai morrer, não vai ter chance! Porém com surpresa nossa, ela aparece, passadas duas semanas com a criança bem doente de pneumonia, tremendamente debilitada e, duvidamos de a poder salvar, mas ficando aqui mais uns dias, iniciamos tratamento, alimentando a mãe para que ela por sua vez alimentasse o filho, mas no melhor da festa ela abandona o tratamento e volta para o “Acampamento”. E, assim foi continuando a aparecer quando o filho estava na última e nós sempre íamos repetindo: -Agora é desta que vai mesmo! Porém a “VIDA” é mais forte do que a morte e o Samedi venceu!! Agora ele tem 9 meses, continua a ser pequenino (não fosse ele pigmeu), mas já pesa 8 quilos. Bem bom! Quando me aproximo dele, ele salta de alegria, sorrindo e abrindo os bracitos para vir ao meu colo. PalmiraAperto-o contra o peito como a um filho muito querido a quem me sinto de ter ajudado a viver. Ele brinca, ri e todo se diverte. É uma criança feliz! Embora continuando a fazer as suas crises de paludismo, diarreia, bronquite, etc., mas pelo menos, a mãe tem ainda o expediente de a trazer quando está mal, até porque, além da medicação, sempre leva o saco cheio de alimentos para os dois.

Penso para mim e para com Deus: “Ainda que, não tivesse feito mais nada, já valeu a pena  vir a Mogoumba para ver esta criança sorrir, depois de a ver destinada a morrer”

Um abraço a tod@s.

Palmira Pinheiro (MSC)

[Moçambique] Encontros Vocacionais

Com o ano escolar 2015, começaram também nossos encontros vocacionais no segundo domingo de cada mês, no centro catequético de Carapira. Já foram realizados dois encontros neste ano. Cabe mencionar que formamos uma equipa vocacional para organizar estes encontros: o irmão Luís (italiano), Irmã Maria Pia (italiana), que nos deu a notícia de que será enviado para a comunidade provincial, por isso vai continuar a apoiar com as suas orações, LMC Beatriz (mexicana), Amanda, voluntária dos Estados Unidos, e o jovem Sabonete (moçambicano), que está a fazer o ano de discernimento para entrar na fase de formação de base no grupo LMC de Moçambique.

Basicamente, são três anos em que a orientação vocacional é dada aos jovens que têm essa preocupação para descobrir o seu caminho a seguir. São apresentadas a eles as vocações específicas (Sacerdócio, Irmã, Irmão, Leigo comprometido), para escolher aquela a qual se sentem chamados por Deus. A Bíblia é a nossa principal ferramenta, saber como as pessoas eram chamados de diferentes formas e como responderam ao chamado recebido, para descobrir que Deus nos chama a todos de diferentes maneiras. Temos a oportunidade de apresentar testemunhos, falar sobre nossas experiências pessoais de quando tínhamos sua idade e, portanto, com jogos, dinâmicas, trabalhos em grupo, plenária, compartilhamos a alegria de anunciar o Evangelho na escolha da sua vocação, e assim ajudar na construção do Reino de Deus.

Melhorias na página WEB

Web LMC

Hoje queremos partilhar convosco as melhorias que estamos a fazer na nossa página WEB. Procedemos à reestruturação da seção de “Recursos Audiovisuais” do nosso site.

Estão agora disponíveis:

  • mais de 5000 imagens sobre a nossa história e o serviço que realizamos como LMC
  • quase 200 vídeos dos LMC e de Comboni (traduzidos em 7 idiomas)
  • mais de 50 canções sobre Comboni em diferentes idiomas para que sejam acessíveis por todos. Agora é possível encontrar as músicas e os vídeos discriminados nas diversas línguas.

Esperamos que esta nova actualização seja do vosso agrado. Venham espreitá-lo neste link.

Cumprimentos

Fortalecei os vossos corações

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO
PARA A QUARESMA DE 2015

 Fortalecei os vossos corações (Tg 5, 8)

Papa FranciscoAmados irmãos e irmãs,

Tempo de renovação para a Igreja, para as comunidades e para cada um dos fiéis, a Quaresma é sobretudo um «tempo favorável» de graça (cf. 2 Cor 6, 2). Deus nada nos pede, que antes não no-lo tenha dado: «Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro» (1 Jo 4, 19). Ele não nos olha com indiferença; pelo contrário, tem a peito cada um de nós, conhece-nos pelo nome, cuida de nós e vai à nossa procura, quando O deixamos. Interessa-Se por cada um de nós; o seu amor impede-Lhe de ficar indiferente perante aquilo que nos acontece. Coisa diversa se passa connosco! Quando estamos bem e comodamente instalados, esquecemo-nos certamente dos outros (isto, Deus Pai nunca o faz!), não nos interessam os seus problemas, nem as tribulações e injustiças que sofrem; e, assim, o nosso coração cai na indiferença: encontrando-me relativamente bem e confortável, esqueço-me dos que não estão bem! Hoje, esta atitude egoísta de indiferença atingiu uma dimensão mundial tal que podemos falar de uma globalização da indiferença. Trata-se de um mal-estar que temos obrigação, como cristãos, de enfrentar.

Quando o povo de Deus se converte ao seu amor, encontra resposta para as questões que a história continuamente nos coloca. E um dos desafios mais urgentes, sobre o qual me quero deter nesta Mensagem, é o da globalização da indiferença.

Dado que a indiferença para com o próximo e para com Deus é uma tentação real também para nós, cristãos, temos necessidade de ouvir, em cada Quaresma, o brado dos profetas que levantam a voz para nos despertar.

A Deus não Lhe é indiferente o mundo, mas ama-o até ao ponto de entregar o seu Filho pela salvação de todo o homem. Na encarnação, na vida terrena, na morte e ressurreição do Filho de Deus, abre-se definitivamente a porta entre Deus e o homem, entre o Céu e a terra. E a Igreja é como a mão que mantém aberta esta porta, por meio da proclamação da Palavra, da celebração dos Sacramentos, do testemunho da fé que se torna eficaz pelo amor (cf. Gl 5, 6). O mundo, porém, tende a fechar-se em si mesmo e a fechar a referida porta através da qual Deus entra no mundo e o mundo n’Ele. Sendo assim, a mão, que é a Igreja, não deve jamais surpreender-se, se se vir rejeitada, esmagada e ferida.

Por isso, o povo de Deus tem necessidade de renovação, para não cair na indiferença nem se fechar em si mesmo. Tendo em vista esta renovação, gostaria de vos propor três textos para a vossa meditação.

1. «Se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros» (1 Cor 12, 26): A Igreja.

Com o seu ensinamento e sobretudo com o seu testemunho, a Igreja oferece-nos o amor de Deus, que rompe esta reclusão mortal em nós mesmos que é a indiferença. Mas, só se pode testemunhar algo que antes experimentámos. O cristão é aquele que permite a Deus revesti-lo da sua bondade e misericórdia, revesti-lo de Cristo para se tornar, como Ele, servo de Deus e dos homens. Bem no-lo recorda a liturgia de Quinta-feira Santa com o rito do lava-pés. Pedro não queria que Jesus lhe lavasse os pés, mas depois compreendeu que Jesus não pretendia apenas exemplificar como devemos lavar os pés uns aos outros; este serviço, só o pode fazer quem, primeiro, se deixou lavar os pés por Cristo. Só essa pessoa «tem a haver com Ele» (cf. Jo 13, 8), podendo assim servir o homem.

A Quaresma é um tempo propício para nos deixarmos servir por Cristo e, deste modo, tornarmo-nos como Ele. Verifica-se isto quando ouvimos a Palavra de Deus e recebemos os sacramentos, nomeadamente a Eucaristia. Nesta, tornamo-nos naquilo que recebemos: o corpo de Cristo. Neste corpo, não encontra lugar a tal indiferença que, com tanta frequência, parece apoderar-se dos nossos corações; porque, quem é de Cristo, pertence a um único corpo e, n’Ele, um não olha com indiferença o outro. «Assim, se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros; se um membro é honrado, todos os membros participam da sua alegria» (1 Cor 12, 26).

A Igreja é communio sanctorum, não só porque, nela, tomam parte os Santos mas também porque é comunhão de coisas santas: o amor de Deus, que nos foi revelado em Cristo, e todos os seus dons; e, entre estes, há que incluir também a resposta de quantos se deixam alcançar por tal amor. Nesta comunhão dos Santos e nesta participação nas coisas santas, aquilo que cada um possui, não o reserva só para si, mas tudo é para todos. E, dado que estamos interligados em Deus, podemos fazer algo mesmo pelos que estão longe, por aqueles que não poderíamos jamais, com as nossas simples forças, alcançar: rezamos com eles e por eles a Deus, para que todos nos abramos à sua obra de salvação.

2. «Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9): As paróquias e as comunidades

Tudo o que se disse a propósito da Igreja universal é necessário agora traduzi-lo na vida das paróquias e comunidades. Nestas realidades eclesiais, consegue-se porventura experimentar que fazemos parte de um único corpo? Um corpo que, simultaneamente, recebe e partilha aquilo que Deus nos quer dar? Um corpo que conhece e cuida dos seus membros mais frágeis, pobres e pequeninos? Ou refugiamo-nos num amor universal pronto a comprometer-se lá longe no mundo, mas que esquece o Lázaro sentado à sua porta fechada (cf. Lc 16, 19-31)?

Para receber e fazer frutificar plenamente aquilo que Deus nos dá, deve-se ultrapassar as fronteiras da Igreja visível em duas direcções.

Em primeiro lugar, unindo-nos à Igreja do Céu na oração. Quando a Igreja terrena reza, instaura-se reciprocamente uma comunhão de serviços e bens que chega até à presença de Deus. Juntamente com os Santos, que encontraram a sua plenitude em Deus, fazemos parte daquela comunhão onde a indiferença é vencida pelo amor. A Igreja do Céu não é triunfante, porque deixou para trás as tribulações do mundo e usufrui sozinha do gozo eterno; antes pelo contrário, pois aos Santos é concedido já contemplar e rejubilar com o facto de terem vencido definitivamente a indiferença, a dureza de coração e o ódio, graças à morte e ressurreição de Jesus. E, enquanto esta vitória do amor não impregnar todo o mundo, os Santos caminham connosco, que ainda somos peregrinos. Convicta de que a alegria no Céu pela vitória do amor crucificado não é plena enquanto houver, na terra, um só homem que sofra e gema, escrevia Santa Teresa de Lisieux, doutora da Igreja: «Muito espero não ficar inactiva no Céu; o meu desejo é continuar a trabalhar pela Igreja e pelas almas» (Carta 254, de 14 de Julho de 1897).

Também nós participamos dos méritos e da alegria dos Santos e eles tomam parte na nossa luta e no nosso desejo de paz e reconciliação. Para nós, a sua alegria pela vitória de Cristo ressuscitado é origem de força para superar tantas formas de indiferença e dureza de coração.

Em segundo lugar, cada comunidade cristã é chamada a atravessar o limiar que a põe em relação com a sociedade circundante, com os pobres e com os incrédulos. A Igreja é, por sua natureza, missionária, não fechada em si mesma, mas enviada a todos os homens.

Esta missão é o paciente testemunho d’Aquele que quer conduzir ao Pai toda a realidade e todo o homem. A missão é aquilo que o amor não pode calar. A Igreja segue Jesus Cristo pela estrada que a conduz a cada homem, até aos confins da terra (cf. Act 1, 8). Assim podemos ver, no nosso próximo, o irmão e a irmã pelos quais Cristo morreu e ressuscitou. Tudo aquilo que recebemos, recebemo-lo também para eles. E, vice-versa, tudo o que estes irmãos possuem é um dom para a Igreja e para a humanidade inteira.

Amados irmãos e irmãs, como desejo que os lugares onde a Igreja se manifesta, particularmente as nossas paróquias e as nossas comunidades, se tornem ilhas de misericórdia no meio do mar da indiferença!

3. «Fortalecei os vossos corações» (Tg 5, 8): Cada um dos fiéis

Também como indivíduos temos a tentação da indiferença. Estamos saturados de notícias e imagens impressionantes que nos relatam o sofrimento humano, sentindo ao mesmo tempo toda a nossa incapacidade de intervir. Que fazer para não nos deixarmos absorver por esta espiral de terror e impotência?

Em primeiro lugar, podemos rezar na comunhão da Igreja terrena e celeste. Não subestimemos a força da oração de muitos! A iniciativa 24 horas para o Senhor, que espero se celebre em toda a Igreja – mesmo a nível diocesano – nos dias 13 e 14 de Março, pretende dar expressão a esta necessidade da oração.

Em segundo lugar, podemos levar ajuda, com gestos de caridade, tanto a quem vive próximo de nós como a quem está longe, graças aos inúmeros organismos caritativos da Igreja. A Quaresma é um tempo propício para mostrar este interesse pelo outro, através de um sinal – mesmo pequeno, mas concreto – da nossa participação na humanidade que temos em comum.

E, em terceiro lugar, o sofrimento do próximo constitui um apelo à conversão, porque a necessidade do irmão recorda-me a fragilidade da minha vida, a minha dependência de Deus e dos irmãos. Se humildemente pedirmos a graça de Deus e aceitarmos os limites das nossas possibilidades, então confiaremos nas possibilidades infinitas que tem de reserva o amor de Deus. E poderemos resistir à tentação diabólica que nos leva a crer que podemos salvar-nos e salvar o mundo sozinhos.

Para superar a indiferença e as nossas pretensões de omnipotência, gostaria de pedir a todos para viverem este tempo de Quaresma como um percurso de formação do coração, a que nos convidava Bento XVI (Carta enc. Deus caritas est, 31). Ter um coração misericordioso não significa ter um coração débil. Quem quer ser misericordioso precisa de um coração forte, firme, fechado ao tentador mas aberto a Deus; um coração que se deixe impregnar pelo Espírito e levar pelos caminhos do amor que conduzem aos irmãos e irmãs; no fundo, um coração pobre, isto é, que conhece as suas limitações e se gasta pelo outro.

Por isso, amados irmãos e irmãs, nesta Quaresma desejo rezar convosco a Cristo: «Fac cor nostrum secundum cor tuum – Fazei o nosso coração semelhante ao vosso» (Súplica das Ladainhas ao Sagrado Coração de Jesus). Teremos assim um coração forte e misericordioso, vigilante e generoso, que não se deixa fechar em si mesmo nem cai na vertigem da globalização da indiferença.

Com estes votos, asseguro a minha oração por cada crente e cada comunidade eclesial para que percorram, frutuosamente, o itinerário quaresmal, enquanto, por minha vez, vos peço que rezeis por mim. Que o Senhor vos abençoe e Nossa Senhora vos guarde!

Vaticano, Festa de São Francisco de Assis, 4 de Outubro de 2014.

 

Francisco